Ao longo destes quase 40 anos, que retratam de forma não muito exata a existência do skate entre nós. Surge uma questão que aparentemente, talvez, incomodem alguns. A questão é a seguinte, existem duas categorias de skatistas? Ou seja, existe o skatista, que aqui chamarei de skatista com uma “alma” voltada para a construção de um estilo de vida mais autônomo, que especula a cada momento a possibilidade de um exercício de liberdade. E isso se dá, talvez, em sua forma de interpretar o mundo e interagir com ele. Algumas vezes transgredindo e transpassando regras e normas sociais (e políticas) de comportamento. Todavia, há outro skatista que numa avaliação mais simplista neste primeiro momento, se revela, como alguém que também anda de skate, e por isso não será correto excluí-lo do “hall” dos skatistas. Mas nele há a ausência de uma “alma” que o incite a andar em outras pistas, passar por outros obstáculos, criar soluções (e ter uma “certa” aversão a padrões). Este skatista em questão está mais próximo dos padrões convencionais e dos estereótipos vigentes. Comunga com todo o sistema ideológico contemporâneo e segue seu curso irrefletidamente. Consumindo tendências da moda, seus produtos, idéias e ideais.
Suponho que o skatista, ao menos o skatista brasileiro ainda tenha uma determinada resistência a caminhar para uma independência conceitual sobre o próprio fato ou ato de ser skatista. E não quero dizer com isso, que devamos, nós skatistas ficar nos perguntando que categoria de skatistas nós somos. Talvez o que nos distancia desta tal liberdade utópica de sermos algo, alguma coisa, ou quiçá, algum ser, seja a preocupação demasiada em “ser”. Mas a problemática de ser skatista dar-se-á, em para que? Ou para quem tenho que “ser”? Aqui reside parte fundamental do problema. Quando estas questões não são substancialmente desenvolvidas por nós, e não digo “resolvidas” e sim desenvolvidas, desta forma, não são acolhidas por nós, ficam a mercê de outros “organismos” ou “entidades” que farão o papel de nos re-significar ou categorizar.
Algumas vezes, uma re-significação ou categorização segundo exigências mercadológicas. E, em nossa contemporaneidade estamos indissociavelmente atrelados ao sistema capitalista, de forma alguma será aqui redundante salientar que o capitalismo hoje não é somente um sistema econômico, como ao menos, suponho, fomos “informados” na escola, por exemplo. Mas, em verdade, uma realidade material, que incide diretamente em nossas vidas, em nossos pensamentos, reflexões e ações. Ou seja, o capitalismo é um “estilo de vida” (um sistema que visa controlar a vida). “Um sistema que transcende e re-significa a economia, cristalizando-se em nós, sobre uma forma de relacionar conosco e com o mundo. Por exemplo, criando-se uma tríade sujeito (skatista) + capital (dinheiro e seus produtos fantasmáticos) + Valor (a partir do capital determinado pelo mercado) = Outro sujeito (outro skatista)”.
Bom... Um tanto quanto complicado? Talvez sim, talvez não. Irei explicar de outra forma. O que anda ausente há algum tempo, são apropriações e a criatividade (originalidade) desafiando o sistema capitalista, para dar-se uma revolução sobre o nosso hoje conceito de viver e ser skatista.
Bem, talvez esta confusa explanação possa iniciar a clarear quando ao assistirmos os dez primeiros minutos de Lords of Dogtown, de Stacy Peralta (2005). Mas não assistir como mais uma ficção cinematográfica ou uma adaptação-representação audiovisual sobre um fenômeno qualquer, a saber, o skate. E sim devemos assistir deixando fluir toda a nossa apreensão, especular ao máximo e criarmos todos os devaneios possíveis. Desta forma, suponho ser provável interagir melhor com a obra e conseqüentemente, nos ditos dez minutos iniciais começará a sentir seu corpo estranho, muito estranho. E isso se desvela porque neste momento recomeçamos a querer algo, a querer sermos nós, e de alguma forma sentimos intensamente, que algum tempo alguma coisa nos direciona a sermos o nosso contrário, nos recalcamos de tal forma, que em vários momentos do filme, os tenho como uma reconciliação ontológica do skatista com ele mesmo distanciado e dilacerado. Isso nos sensibiliza, nos afeta profundamente. O que se dá a seguir é o nosso estomago embrulhar, nossas pernas tremerem e até o final da obra as lágrimas brotam mente a fora. E talvez vc saiba (ou não) que skatista é ou será.
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